quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

KOYAANISQATSI - GODFREY REGGIO

Por trás de um título complicado, documentário se supera com imagens belas e delirantes de um mundo em decomposição

José Donizetti Morbidelli

“Desenterrando coisas valiosas, estaremos chamando a desgraça. Aproximando-se o dia de purificação, o céu encobrir-se-á de teias de aranha. Um vazo cheio de cinzas poderá cair do céu; poderá queimar a terra, e agitar os mares.”
Estará o homem diante de uma visão apocalíptica, que poria um fim ao caos que domina o mundo?
Fazendo uma análise da evolução do homem na terra, desde os primórdios da existência - ainda na Pré-História - até a atualidade, a pergunta que fica é a seguinte: para onde essa evolução irá conduzir o ser humano? Koyaanisqatsi é como uma síntese da existência do mundo, desde quando o homem era apenas um elementar ser vivo, quando não havia a preocupação ou a ganância da conquista de territórios, distante da ambição material e da mesquinhez que resultou no caos que se vê atualmente. Não se trata de uma crítica à evolução tecnológica, mas um alerta sobre o destino da humanidade. As guerras surgiram para medir forças entre as nações, para incentivar a indústria e a tecnologia visando a autodefesa.
Mas defender quem e do quê?
Defender o homem do próprio homem.
Pode parecer hipotético um comentário assim dentro da escala animal, mas o maior inimigo do ser humano tornou-se o próprio ser humano. Essa ambição coloca em risco a vida do planeta como um todo, que não pertence ao homem uma vez que ele é apenas um elemento integrante do meio.
O início lento do filme apresenta imagens do mundo natural, livre da ocupação humana, o que leva o telespectador a se deliciar com o fantástico planeta azul. O ritmo cadenciado não prenuncia uma sucessão de imagens fortes, com o poder da chamada civilização transformando a paz em desordem. Os detalhes da ocupação e do domínio humano são apresentados sem nenhum pudor. A tecnologia, as cidades, a correria, os símbolos do poder capitalista traduzem um conjunto de desunião e rivalidade, evidenciada principalmente quando nos tornamos testemunhas de explosões e depredações, maiores exemplo da destruição humana.
O espetáculo visual transforma-se de forma negativa e a aceleração do ritmo acompanha o compasso, até a música cadenciar novamente, como se fosse a única força capaz de restabelecer a ordem. Entretanto, o maior exemplo da ganância do homem está na tentativa da conquista do espaço. As consequências são catastróficas e o que se observa é mais uma explosão, talvez um castigo pela ocupação de um território acima de seu poderio. Seria o poder divino alertando o homem para que se coloque no seu devido lugar, em vez de brincar de imitar o Criador?

Recanto das Letras - 2005 (http://recantodasletras.uol.com.br/resenhasdefilmes/86601)

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segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

DESAFIANDO GIGANTES - ALEX KENDRICK

Desafiando Gigantes, produzido por uma igreja americana, surpreende pela qualidade e forte conteúdo espiritual

José Donizetti Morbidelli

“O que é impossível para Deus?”, pergunta o treinador. “Nada”, respondem, convictos, os jogadores. O diálogo pode não ser lá muito comum em competições esportivas, mas dá a tônica do filme Desafiando Gigantes (Facing the giants, EUA, 2006, Sony). Recheado de mensagens cristãs, o longa é daqueles trabalhos capazes de encher os crentes de orgulho. Produzido pela Sherwood Baptist Church, em Albany, Estado de Nova York, Desafiando gigantes tem uma proposta claramente evangelística – mas não abre mão da qualidade. Com um orçamento que, para a indústria cinematográfica, não passa de ninharia – 100 mil dólares –, a produção ficou cerca de quatro meses em cartaz em mais de mil cinemas americanos e foi eleito um dos dez melhores filmes esportivos de 2007 pela revista Sports Illustrated. Além disso, foi distribuído para quase 60 países e já arrecadou nada menos que US$ 10 milhões.
O projeto nasceu da certeza, baseada em pesquisas, que o cinema exerce mais influência do que a própria Igreja na sociedade americana. Se o elenco não traz nenhum astro de Hollywood – pelo contrário, é formado por voluntários da própria igreja de Albany –, coube ao roteiro a árdua tarefa de conquistar o público, tendo como foco principal pessoas não despertadas pelo Evangelho. A história é simples. Um técnico de futebol americano chamado Grant Taylor(papel interpretado por Alex Kendrick, que também é o diretor), vê o time que dirige, ligado a uma escola, entrar crise após a saída do principal jogador. A partir daí, a equipe perde toda a auto-estima e motivação para competir. Prestes a entregar os pontos e ainda por cima enfrentando problemas de ordem pessoal, ele recorre a Deus e ao poder da fé, lançando mão de passagens bíblicas e princípios de fé para devolver ao grupo a confiança para vencer.

Censura – Além de igrejas de diferentes denominações e ministérios, escolas americanas e até presídios têm realizado sessões especiais de Desafiando Gigantes. Pudera – o conteúdo espiritual é tão explícito que o filme recebeu o selo PG da Associação de Cinema dos Estados Unidos, órgão responsável por classificar as produções de acordo com a faixa etária a que se destinam. A certificação significa que menores de idade só podem assistir às apresentações públicas acompanhados dos pais ou responsáveis legais. De acordo com Kris Fuhr, vice-presidente de marketing da Provident Films – uma das ramificações da Sony Pictures – , a “censura” se deve às fortes mensagens evangélicas, o que poderia ofender os adeptos de outras crenças religiosas.
No Brasil, Desafiando Gigantes não passou pelos cinemas, mas mesmo assim a repercussão tem sido grande. Em março, a Juventude Batista Capixaba (Jubac), entidade ligada a Convenção Batista do Espírito Santo, realizou, em Vitória, o congresso de adoração Reação Teen 2008, com o tema “desafiando gigantes”, numa alusão à mensagem transmitida pelo longa-metragem. “O que nos chamou a atenção no filme foi a força para superar os desafios, que é um dos valores que pregamos aos nossos membros”, explica Diego Bravin, diretor executivo da Jubac.
Mas não é só entre o público evangélico que a produção da Igreja Batista de Albany tem feito sucesso no Brasil. Apaixonada por cinema, a curitibana Cláudia Cartes encontrou o filme na prateleira da locadora e não resistiu à curiosidade. “Há um forte apelo religioso, mas isso não tira suas qualidades”, ressalta a economista que, apesar de não ser crente, garante que acredita em Deus e que não ficou nem um pouco desapontada com o que viu. “Gostei da história, me emocionei com o filme e o recomendo a todos”, revela.

Fonte: Revista Eclésia - Edição 123

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sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

A NOITE DE SÃO BARTOLOMEU

Um dos maiores massacres da História, a Noite de São Bartolomeu vitimou 100 mil protestantes e teve reflexos sobre a evangelização do Brasil

José Donizetti Morbidelli

Com o advento do Cristianismo, o mundo – mais precisamente, o velho continente europeu – passou por muitas crises de ordem política e social, mas nada se compara ao conflito protagonizado por católicos e protestantes na França, no século 16, em decorrência de divergências entre a nobreza, o clero e a burguesia, agravadas pelo crescimento das correntes protestantes. Seguidores remanescentes de Martinho Lutero (1483-1546), que para contestar os abusos eclesiásticos fixou suas idéias de renovação na porta de uma igreja na Alemanha, iniciando assim a Reforma protestante; e de João Calvino (1509-1564), que fundou a Igreja Reformada e inseriu uma nova maneira de pensar a relação de Deus com a humanidade, foram os personagens de uma revolução religiosa que abalou as estruturas da Igreja Católica. Apesar de divergir do luteranismo em alguns aspectos, o calvinismo teve grande influência para o fortalecimento do pensamento reformista.
Antes da Reforma protestante, o catolicismo – imposto pela força coercitiva – era a religião oficial da Europa. E como autoridade máxima da Igreja Católica, as decisões do papa tinham tanto valor quanto as Escrituras Sagradas. Contudo, uma série de práticas que não condiziam com a atitude dos chamados “representantes de Deus”, como a riqueza material do alto clero, o uso indevido do dinheiro das ofertas e a prática da simonia – comércio de materiais sagrados e venda de cargos eclesiásticos – estava levando o povo à miséria e revoltando as camadas mais baixas da população. Esse descontentamento foi um dos motivos do surgimento de pensamentos reformistas baseados, principalmente, na doutrina de salvação somente pela fé e não pelas práticas cristãs. Por sua vez, o catolicismo ensinava que para alcançar a salvação era necessária a fé e a realização de boas obras estabelecidas pela igreja. Além do mais, os reformistas também julgavam inúteis o trabalho exercido pelos mediadores entre Deus e os fiéis.
Enock da Silva Pessoa, professor do departamento de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Acre, destaca a importância da ação promovida pelos reformistas: “Um grande número de intelectuais defende a Reforma protestante do século 16 como um marco histórico relevante na luta pelas liberdades democráticas, individuais e coletivas, e o luteranismo alcançou os objetivos de libertação social, política e religiosa, diminuindo a dominação política da Igreja sobre o Estado”, aponta.

Abusos – Os abusos do clero descontentavam também o rei da Inglaterra, Henrique VIII, que rompeu definitivamente as relações com o papa Clemente VII e promoveu a Reforma protestante em seu país. Assim, surgiu a Igreja Anglicana, da qual o monarca tornou-se chefe supremo, exigindo obediência dos súditos sob a pena de morte. Ainda, em solo inglês, fincaram-se os alicerces da Igreja Presbiteriana, também em decorrência de questões político-sociais.
Diante desse quadro, a Igreja Católica viu-se obrigada a tomar providências para manter a ordem e restabelecer seu poder nos principais centros europeus. Se a Reforma teve maior adesão em países com a Alemanha e a Inglaterra, na França – onde o absolutismo era mais radical – a entrada dos reformistas não foi nem um pouco pacífica, o que agravou ainda mais a crise entre as oposições religiosas. Em decorrência desse conflito, surgiram dois partidos políticos, cada um com interesses próprios: do lado dos católicos, o Papista; e, em favor dos protestantes, o Huguenote, expressão depreciativa atribuída pelos católicos franceses. Seguidores de João Calvino – um segmento formado por artesãos, comerciantes e nobres –, eles viviam no oeste e sudoeste francês sob constante ameaça, empenhados em disputas religiosas que se alastraram por várias cidades e culminou na madrugada de 24 de agosto de 1572, quando milhares de calvinistas foram massacrados, num dos episódios mais sangrentos que a História registra. Pegos de surpresa com ataques planejados pela família real e mediante o beneplácito da Igreja Católica, os huguenotes nada puderam fazer além de sucumbir sob as lanças e espadas do exército francês.
Do alto das torres sinos repicavam, nas ruas formavam-se procissões alegradas por cânticos de louvor em agradecimento a Deus pelos extermínio dos “hereges” e pela liquidação dos “malditos”. Em Roma, os sinos também soaram, denotando o contentamento do papa pela vitória dos católicos e da Coroa francesa sobre a corrente protestante, vista como uma peste que colocava em risco a liderança exercida pelo conclave. Até uma moeda comemorativa foi cunhada, além do pontífice encarregar o artista Giorgio Vasari da pintura de um mural celebrando o ocorrido. Por ter ocorrido em 24 de agosto, dia dedicado ao santo católico Bartolomeu, o episódio ficou conhecido como Noite de São Bartolomeu.

Semente – “A Noite de São Bartolomeu evidenciou a rivalidade política dos partidos que usavam a religião como pano de fundo para encobrir outros interesses”, comenta Arthur Prado Netto, pesquisador da Oficina Cinema-História, núcleo ligado ao departamento de História da Universidade Federal da Bahia. O estopim para a carnificina teve como precedente uma série de ligações envolvendo membros da nobreza. A França vivia sob o reinado do jovem Carlos IX, mas quem dava as ordens era sua mãe – Catarina de Médicis – que julgava o filho incapaz de tomar decisões importantes. Para acalmar as hostilidades entre católicos e protestantes, a solução encontrada foi uma aliança, o casamento de sua filha, Margarida de Valois, com o protestante Henri de Navarra, um aspirante ao trono.
O imbróglio começou quando um agente católico tentou assassinar o líder huguenote Gaspard de Coligny a mando da rainha-mãe, por receio da influência que ele exercia sobre o rei. Apesar da tentativa frustrada, o episódio enfureceu os protestantes. Convencido pelos aliados de que, durante a festa de casamento, centenas de calvinistas estariam em Paris tramando uma conspiração para tirar a coroa e a vida do monarca, Carlos IX não teve dúvidas e autorizou o massacre em massa dos supostos conspiradores, inclusive de seu líder. Com a bênção e a absolvição do crime por parte do papa Gregório XIII aos católicos, os ataques continuaram, atingindo as principais cidades do país. As águas dos rios ficaram infestadas por cadáveres insepultos, e o mau cheiro se espalhou pela capital francesa por vários meses. Pela estimativa, quase 100 mil huguenotes foram mortos durante os conflitos. Historicamente, a Noite de São Bartolomeu ficou conhecida como a mais terrível entre as ações diabólicas de todos os tempos. Os sobreviventes ao massacre foram obrigados a largar os pertences e fugir, espalhando-se pela Europa. Em nome da França, então chamada de a “filha predileta da Igreja”, a rainha jurou que, a partir daquele dia, nenhum protestante nasceria naquele solo. A “peste”, segundo a ótica católica, havia sido exterminada – contudo, o episódio foi muito mais além. A partir dali, a teologia reformada espalhou-se pelo mundo. O episódio acabou tendo reflexos diretos sobre o Brasil. Fugindo da França que ardia em perseguições, o primeiro grupo de protestantes a desembarcar em terras brasileiras foi trazido pelo aventureiro Nicolas Durant de Villegagnon em 1557, com o objetivo de fundar uma colônia para os perseguidos. Dois anos mais tarde, aportou por aqui um grupo de apóstolos com missão evangelística, formado na maioria por protestantes. Era a França Antártica, empreitada que acabou não dando certo mas entrou para a História como a primeira tentativa efetiva de evangelização no Brasil, um passo decisivo para que o país chegasse ao século 21 como a segunda maior nação evangélica do mundo.

Fonte: Revista Eclésia - Edição 118

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quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

NÓS QUE AQUI ESTAMOS POR VÓS ESPERAMOS - MARCELO MASAGÃO

Com música melancólica e penetrante, documentário faz uma retrospectiva do século 20, marcado por guerras, tecnologia e insanidades

José Donizetti Morbidelli

Ao iniciar o relato visual da história de seus personagens, o autor utiliza-se de imagens de sepulturas, e ao concluir o trabalho faz com que o telespectador perceba o significado do título do filme. Nós que Aqui Estamos por Vós Esperamos sugere que a morte iguala a todos, que o homem veio do pó e ao pó retornará, independente de seus feitos no decorrer da vida.
Numa espécie de retrospectiva poética do século 20, Marcelo Masagão antecipa a comparação entre os seres humanos, procurando relatar com o mesmo grau de importância a vida de celebridades, como o bailarino Nijinski, o ator Fred Astaire e o jogador de futebol Garrincha, com pessoas absolutamente comuns, como uma empacotadora de cigarros, trabalhadores industriais e garimpeiros de Serra Pelada. Assim, busca uma conscientização do telespectador da importância de cada indivíduo para a história. Todos se completam e são totalmente dependentes entre si.
O filme não se restringe somente a uma retrospectiva, mas também à busca incessante dos sonhos e ideais do ser humano. Alguns limitam-se à simples questão da sobrevivência, como operários que trabalham em indústrias automobilísticas mas que jamais tiveram condições de possuir um automóvel. Outros comprovam a onipotência humana, como o pintor com a roupa especial para encontrar-se com Deus, ou ainda o alfaiate francês imitando um pássaro e lançando-se da Torre Eiffel, imagem que se funde com a explosão de um ônibus espacial americano. Torna-se explícito o egoísmo humano, o desejo de conquistar o inconquistável e, por meio de sobreposição de imagens, o telespectador é direcionado a conhecer o pensamento dos personagens.
“Os homens criam as ferramentas, as ferramentas recriam os homens.”
Infelizmente a irracionalidade das guerras não deixa de fazer parte das imagens do século, a vaidade humana em busca de poder e glória. Digo “irracionalidade” porque as guerras são iniciadas por aqueles que nunca carregaram um fuzil ou explodiram uma bomba na cabeça de outro, homens que ficam em seus escritórios ventilados no verão e aquecidos no inverno, com a barriga cheia, contando as baixas do exército inimigo ou encaminhando os mortos a seus parentes, achando ainda que fazem um grande serviço: aqui vai um herói, que perdeu a vida lutando bravamente pela liberdade do mundo. Os versos do soldado Kato Matsuda, morto em 1945, representam com dignidade essa visão do absurdo das batalhas.
“Papai, mamãe, me desculpem
por ser um filho ingrato.
Não há pior desgraça
do que um filho morrer antes dos pais,
isso foge à ordemnatural das coisas.
No meu silêncio já refleti muito
sobre o sentido e a finalidade
desta guerra. Mas estar aí junto a vocês
seria uma grande humilhação...”
E a tela continua sendo bombardeada com imagens que resgatam a memória do século, com uma melancolia ressaltada pela trilha sonora, mas também com momentos que sugerem um certo otimismo em relação ao futuro. A busca da felicidade é o objetivo que melhor traduz o que deveria ser a essência da existência humana, mas será que a felicidade existe?
“Dizem que em algum lugar, parece que no Brasil, existe um homem feliz.”

Recanto das Letras - 2005 (http://recantodasletras.uol.com.br/resenhasdefilmes/86602)

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quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

DO CONCEITO DE ARTE À CULTURA CRISTÃ

A partir das primeiras manifestações artísticas, o homem passou a redefinir o conceito de arte

José Donizetti Morbidelli

No processo de produção de conhecimento, o homem foi obrigado a desenvolver suas primeiras experiências de vida. Diante dessas experiências, surgiu o sentimento, característica que o difere de outros animais, e que o levou a desenvolver manifestações para demonstrar as emoções. A essas manifestações, dá-se o nome de “arte”. Resumindo, a arte é a manifestação dos sentimentos do ser humano, a forma de expressar por meio de objetos, esculturas, pinturas, o universo de suas emoções.
Os primeiras indícios artísticos surgiram no Período Paleolítico, tendo como evidência as pinturas nas cavernas que retratavam elementos naturais, ou seja, a visão que o “homem das cavernas” tinha do meio em que vivia. As pinturas, desenvolvidas com apenas contornos ou cores brilhantes, revelavam uma visão fantástica da vida. O pintor do período supunha ter poder sobre o animal desde que o representasse inferiorizado, como é o caso do “Bizão Ferido”, encontrado na caverna de Altamira, Norte da Espanha. Em virtude do desconhecimento do homem na participação do processo de reprodução, era concedida à mulher uma idealização divina, sendo elas assim apresentadas. Ainda na Pré-História, na Idade da Pedra Polida – Neolítico – ocorrem grandes transformações na história da arte. O homem começa a abandonar o estilo naturalista e inicia a representação de sua vida coletiva, surgindo uma idéia de movimento por meio da imagem fixa, como danças, que poderiam estar ligadas ao trabalho de plantio e colheita. A primeira forma de escrita também data-se desse período, baseada na remodelação da natureza pelos desígnios, desejos e da satisfação interior do ser humano, e que consistia na representação de seres e idéias por meio do desenho. Mais tarde, essa satisfação seria chamada pelos gregos de prazer estético. A preocupação com a beleza fica evidenciada nas artes em cerâmicas. As construções de moradias de pedras (dolmens) são consideradas uma das primeiras obras de arquitetura que a história registra.
Ao descobrir sua capacidade de adaptar-se ao mundo, o homem começa a se tornar civilizado, descobrindo-se agricultor e organizando a sociedade em que vive. Como elementos da estrutura do poder, há a união da força física e das idéias e, como fruto desse trabalho intelectual, surgem os primeiros sinais sagrados.
Na Antigüidade, as manifestações artísticas das chamadas grandes civilizações iniciaram-se na Mesopotâmia, onde ainda não havia um conceito definido. A arte, assim como a música e a dança, consistia num elemento da religião, vista também como um instrumento do poder. A ética da religiosidade não era bem definida, não havia uma concepção de separação entre o bem e o mal, reverência a Deus e ao Demônio. Notava-se um tratamento especial para os olhos, vistos como as janelas e as portas da alma. A arquitetura caraterizava-se pela presença de argila em substituição às pedras, como os Jardins Suspensos da Babilônia.
Os egípcios pensavam na vida como uma espécie de penitência e não como uma dádiva divina, o que os levavam a uma preparação para a morte, considerada a grande ideologia do povo. Assim, surgiram uma das mais importantes manifestações arquitetônicas de arte: as pirâmides ou suntuosos túmulos dos faraós. A partir da 4ª dinastia, as pirâmides foram substituídas por túmulos menos suntuosos, caracterizando-se como artes convencionalistas. Foram também os egípcios que iniciaram a trabalhar os “capitéis”, que mais tarde influenciariam os gregos. Nota-se na arte egípcia a exposição das figuras com os rostos de perfil, contudo com os olhos, também vistos como as janelas da alma, e o corpo, em virtude do posicionamento do coração, apresentados de frente. As esculturas, sempre talhadas em pedra, tinham a caraterística de serem pintadas com cores berrantes.
O Classicismo, ideal de beleza e perfeição, representou o apogeu da arte grega. Apesar da importância artística dos egípcios, foi na Grécia que surgiu o conceito contemporâneo de arte, tratando-se de uma visão racional, uma tentativa de explicar o mundo pela razão e não pelos sentidos (mítico, místico, religioso e esotérico) presentes nas culturas anteriores. Contudo, o pensamento racional ainda não consegue se libertar dos pensamentos anteriores. A arte grega teve a egípcia como a maior fonte inspiradora, aplicando a mesma simetria natural para representar o corpo humano,porém com uma anatomia diferente, mais desenvolvido e com mais vivacidade. A força física era considerada o padrão ideal para modelar o corpo masculino, e indicava uma preparação para a guerra. Pelo fato de não ter uma função religiosa a exemplo do Egito, a arte pôde evoluir livremente. Os templos, considerados como as casas de Deus, são as edificações que mais despertam interesse na arquitetura, mais influenciada pelos cretenses e constituída por três ordens arquitetônicas, termo utilizado somente em relação à arquitetura grega: dórica, jônica e coríntia. O teatro de tragédias e comédias, como manifestação artística, também surge na Grécia.
A mitologia, ou seja, todo o pensamento possível para explicar os acontecimentos até que haja uma teoria racional, teve a sua origem nas tradições gregas como cultura oral, transformada em literatura pelo precursor Homero (fato ou lenda), que escreveu “Ilíada” e “Odisséia”. Pela importância da mitologia no mundo antigo e até no contemporâneo, a mitologia pode também ser vista como uma manifestação artística. Uma importante característica no estudo mitológico é a representação de deuses com a imagem e semelhança dos homens. Se Homero constitui a fonte primária para o estudo da mitologia grega, Hesíodo também merece destaque, por retratar em “Teogonia” a criação do mundo na visão de seu povo. Do conflito de duas forças antagônicas, o Caos, entidade não material, e o Eros, que representava a união e a ordem, nasce uma entidade física denominada Gaia, a deusa terra.
Pelas poderosas estruturas coercitivas (força física e ideológica) presentes no Império, os romanos estruturam seu poder. Da união dessas forças, surgiu o “Direito Romano”, cujos princípios estão presentes na vida do ser humano até a atualidade. A maior manifestação artística da arte romana é a arquitetura, clássica do ponto de vista formal e voltada à exaltação do Império na visão do conteúdo. O Coliseu, enorme anfiteatro no centro velho da cidade e o Pantaleão, templo dedicado a todos os deuses, são exemplos da engenharia arquitetônica. Em Pompéia, encontram-se os últimos vestígios de afrescos, técnica úmida de pintura em paredes que imitavam painéis e cenas arquitetônicas, como testuras naturais de pedra ou figuras não abstratas. Em pinturas encontradas na Casa de Ivete, a manifestação dos desejos carnais do homem é representada de maneira explícita para os padrões da época. Exageradamente apaixonados pela cultura grega, os romanos acabaram trabalhando os mesmos temas clássicos.
A religiosidade constituía um dos pontos vulneráveis do Império, que não a impunha aos povos conquistados justamente pelo fato de não ter uma religião definida. Com o surgimento e a longa perseguição ao Cristianismo, perdura em Roma durante vários séculos um classicismo decadente, acompanhado de uma nova cultura e manifestação artística em ascensão, a paleocristã ou primitiva cristã. Inicialmente, durante a repressão romana, a única forma de arte que merece destaque são as pinturas nas paredes das catacumbas subterrâneas, utilizadas pelos cristãos para enterrar seus mortos e para pregações. O fim do Império Romano do ocidente e o início da Idade Média marcou o triunfo do Cristianismo, após ser oficializado pelo Imperador Constantino. A arquitetura do período foi marcada pela construção de igrejas. A escultura teve um papel secundário devido à proibição de imagens contidas no Velho Testamento, restringindo-se a formas pequenas que retratavam passagens e temas bíblicos. Os sarcófagos construídos para os membros mais ricos da congregação são considerados as primeiras esculturas cristãs.
Após a oficialização do Cristianismo e o surgimento da arte paleocristã, outras manifestações foram surgindo como a cultura bizantina (Império Romano do Oriente), nome referente à cidade de Bizâncio que foi alterada para Constaninopla em homenagem ao imperador Constantino. No Ocidente, segue uma cultura hemogênea chamada de arte românica, tendo a literatura como a grande manifestação da época. Por fim, a arte gótica, surgida na Europa Setentrional, expressada principalmente pela construção de suntuosos reinos medievais.

Recanto das Letras - 2006 (http://recantodasletras.uol.com.br/redacoes/107667)

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terça-feira, 16 de dezembro de 2008

SÉCULO XX O SÉCULO DO IMPERIALISMO - EMIR SADER

Obra do escritor Emir Sader aponta o capitalismo como o responsável pelos conflitos desencadeados entre as nações do mundo

José Donizetti Morbidelli

No livro Século XX – Uma Biografia Não Autorizada – O Século do Imperialismo (Editora Fundação Perseu Abramo), Emir Sader apresenta uma retrospectiva política do século XX, apontando o capitalismo como o maior responsável pelas crises e conflitos que marcaram o período, e a hegemonia de alguns países imperialistas em detrimento dos menos afortunados. Compara ainda os reflexos do capitalismo e do socialismo, representados respectivamente pela Inglaterra após a Revolução Industrial e Estados Unidos, e pela União Soviética após a Revolução Russa.
É a partir do conflito dos ingleses contra a África do Sul (Bóeres) e a China (Boxers) que o autor inicia a viagem histórica pelo século. O sucesso nas batalhas permitiu à Inglaterra impor sua cultura naqueles países, mesmo tendo se criado um preconceito exacerbado, principalmente em relação à África do Sul, onde a maioria da população é de etnia negra. Diferentemente do colonialismo da época das grandes navegações, a Inglaterra valeu-se do imperialismo, ou seja, a conquista de novos territórios por meio de invasões e força coercitiva. É esse imperialismo que vai marcar grande parte do século.
Com a ascensão dos Estados Unidos, a Inglaterra apresentou uma decadência, e os norte-americanos passaram a influenciar todo o mundo por meio de sua cultura de dominação. O êxito do capitalismo propiciou o surgimento de ideologias políticas de oposição – o socialismo – que, embora tenha se originado das idéias de Karl Marx, agiu com maior clarividência a partir da Revolução Russa de 1917. A revolução, que teve como principal dirigente bolchevique Lênin, foi tão importante que resultou num crescimento incontestável da economia russa. A nova União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) confirmou-se como o maior centro socialista do mundo contemporâneo. Mesmo com a morte de Lênin em 1924 e a sucessão de Josef Stalin, o país continuou com o regime. Com o final da 2ª Guerra Mundial e o triunfo da Revolução Chinesa em 1949, a União Soviética passou a ser reconhecida como potência mundial, juntamente com os Estados Unidos e a Inglaterra. Iniciava-se o período denominado de “Guerra Fria”, com os ideais socialistas defendidos pelos soviéticos batendo de frente com o capitalismo norte-americano. O planeta, nitidamente, dividia-se em dois blocos antagônicos, e as divergências entre os Estados Unidos e a União Soviética iriam gerar diversos focos de conflitos pelo mundo, como forma de cada um ampliar seu poder e difundir seus ideais políticos. Até o espaço tornou-se um campo a ser explorado, e o sucesso da corrida espacial permitiria ao país conquistador a ascensão e o reconhecimento tecnológico no planeta. Por fim, o capitalismo sagrou-se vencedor, tendo como importante precedente a crise ocorrida no Leste Europeu, onde a maioria dos países adotavam o regime socialista. A queda do muro de Berlim, reunificando a Alemanha, dividida politicamente desde 1949, foi um marco histórico importante na vitória do capitalismo frente ao socialismo. A abertura política e a independência das ex-repúblicas socialistas extinguiram com a União Soviética, já no governo de Boris Yeltsin em 1991. Entretanto foi durante o governo de Gorbachev que a Guerra Fria chegou ao fim. Atualmente apenas dois países ainda são governados sob regime socialista: Cuba e Coréia do Norte. Anteriormente à Guerra Fria, também houve a ascensão alemã que, por intermédio de um regime ditador – nazismo de Adolf Hitler – impôs seu domínio a grande parte da Europa.
O domínio exercido por alguns países desencadeou uma grande crise social nos países que compõem o bloco do “terceiro mundo”. A irregularidade da distribuição de renda é um dos maiores exemplos dessa discrepância entre os que dominam e os dominados. A liberdade política e econômica dos países emergentes tornou-se utópica, uma vez que ficaram à mercê dos poderosos. No caso específico da América Latina, o domínio norte-americano se expressou de forma mais direta a partir da vitória na guerra contra a Espanha em 1898, possibilitando a intervenção na região caribenha (Cuba, Porto Rico, Filipinas e Ilhas Gwam). Com o tempo, a hegemonia dos Estados Unidos também influenciou os costumes, a política e a economia dos países que compõem o continente sul-americano.
As revoluções ocorridas na América Latina, principalmente a Cubana de 1959, tornou o país um foco socialista no continente, aderindo-se à União Soviética e se libertando do jugo norte-americano. Se por um lado a ilha de Fidel Castro prosperou, por outro estagnou. Che Guevara, o maior líder da Revolução Cubana, morreu sem realizar o sonho de construir um centro de coordenação dos movimentos revolucionários, que começavam a surgir no continente latino-americano. Contudo, sua mensagem e imagem o tornaram um símbolo de rebeldia e da luta por uma sociedade mais justa.
O século XX pode, portanto, der definido como o “século das guerras” ou ainda contado como a “história do capitalismo norte-americano”. Mas será que o capitalismo representa o regime ideal? Apresenta suas falhas, partindo do princípio que mais de dois séculos não foram suficientes para se conquistar a liberdade, igualdade e fraternidade. Para a indústria bélica norte-americana, as guerras são sempre um grande atrativo, pois o país detém mais de 40% da produção mundial.
Os conflitos do final do século apenas confirmaram o poderio de fogo inquestionável dos Estados Unidos. Com a hegemonia mundial ameaçada, a economia e sistema de defesa abalados, os norte-americanos trataram logo de se impor e a guerra contra o terrorismo ganhou grande notoriedade. A manipulação da opinião pública os levou à condição de vítima, o que não condiz com a realidade. Talvez essa seja a estratégia, distorcer os fatos com o propósito de persuadir a população mundial. Embora seja uma atitude que causa indignação, não se pode negar que é uma campanha de marketing muito bem elaborada.

Recanto das Letras - 2006 (http://recantodasletras.uol.com.br/resenhasdelivros/96427)

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segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

O ESTRANGEIRO - ALBERT CAMUS

Numa de suas principais obras, o escritor franco-argelino Albert Camus faz do existencialismo a razão máxima de sua existência

José Donizetti Morbidelli

“Compreendi, então, que um homem que houvesse vivido um único dia, poderia sem dificuldades passar 100 anos numa prisão. Teria recordações suficientes para não se entediar.”

Essa frase traduz perfeitamente a exploração do absurdo, conceito que caracterizou o escritor Albert Camus. O personagem principal do romance mergulha num mundo sem emoções e sentimentos, e é a carência de sensibilidade que se transformará na própria arma que o tornará vítima da justiça. Entretanto, nem mesmo a máquina judiciária o fará mudar de comportamento.
A obra de Albert Camus surge para tentar contrariar o conceito de que a arte é a manifestação dos sentimentos do ser humano. A inexistência de emoções leva o personagem a um vazio interior, causando uma profunda resignação no leitor. É impossível não sentir um mal-estar diante dessa frieza. Contudo, analisando a obra pelo lado do realizador e não na visão do personagem, é incrivelmente bem sucedida a maneira de conduzir o leitor a uma reflexão existencialista da vida. Resumindo, Albert Camus é um verdadeiro artista na concepção da palavra por mexer com os sentimentos do leitor, mesmo que esses sentimentos sejam de total repugno diante da leitura.
Mersault, o personagem central, jamais seria um artista pelo fato de ser totalmente dominado por um vazio, por uma crise existencial que ultrapassa as fronteiras da compreensão humana. Desde a notificação da morte da mãe, passando por um ato homicida até a confirmação da condenação, ele age da mesma maneira. Essa indiferença não se faz presente somente nesses fatos, os mais importantes dentro da trama, mas também em outras situações elementares e relacionamentos de menores relevâncias. O absurdo existencial do personagem procura conduzir o leitor a uma identificação com essa experiência, a mergulhar num mar vazio, onde a essência da vida é simplesmente viver. Por outro lado, a análise do trabalho como “arte” reside na capacidade de modificar o comportamento do leitor, ou o mesmo se adere à crise existencial ou repudia a conduta, repúdio que poderá comprometer a própria relação com o autor.
Talvez seja esse conflito que Albert Camus queira estabelecer em nossas vidas, a visão de que somos nada mais do que simples animais irracionais em nossa singela existência, que a morte nada mais é do que uma conseqüência natural da vida, e que os sentimentos e a racionalidade não podem prevalecer diante de qualquer circunstância.

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sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

ANÁLISE DO FILME 1984 CONFORME A INDÚSTRIA CULTURAL DE T.W. ADORNO

Adaptado para o cinema, obra clássica de George Orwell faz alusão ao partido do ditador soviético Joseph Stalin

José Donizetti Morbidelli

Adaptação cinematográfica do livro 1984, escrito por George Orwell em 1948 e que discute a dominação das massas por um regime autoritário e ditador. O poder adultera a mente das pessoas, e a única alternativa é aceitar e jurar lealdade ao partido. O sistema é imutável, e tudo o que desviar a atenção ou comprometer essa relação entre o domínio exercido sobre a massa, tem que ser combatido. Críticas, revoluções e questionamentos que interfiram na sociedade são encarados como patologia social – concepção positivista.
A propriedade fundamental da indústria cultural, segundo T. W. Adorno, é impor uma ideologia às massas, desviando as atenções da realidade no sentido de se configurar uma cultura de dominação. O consumidor torna-se, portanto, um mero elemento dentro de sistema e, de forma inconsciente, adere ao que lhe é imposto. Contudo, a indústria cultural não teria condições de prosperar sem a existência das massas.
Todos fazem parte de um determinado regime, assim como no filme em análise, apesar do meio social atual não ser tão pragmático a ponto de privar o ser humano da liberdade de pensamento, emoções e outros prazeres citados no longa metragem. Há de ser analisada a ideologia de ambos que, guardada as devidas proporções, constituem-se da mesma essência: o caráter de dominação.
Como exemplo dessa dominação, novas línguas e códigos são criados, e todos são obrigados a se adaptarem às linguagens que são determinadas. No filme, a menção da Nova Língua – 10º Dicionário – indica perfeitamente essa imposição do código. A história é apagada, palavras são destruídas e outras são criadas, de forma que não instiguem o pensamento. O código busca uma linguagem perfeita, e quando todos o conhecerem não haverá mais necessidade de disciplinas. É o imperativo categórico da indústria cultural, que isenta a condição do indivíduo pensar o mundo a sua volta. O medo constitui um dos principais motivos da aceitação do sistema, torna-se explícito que qualquer um que infringir a lei deverá ser punido. Na ficção por meio de torturas e lavagem cerebral e, na realidade, por persistência.
A mente é treinada ainda para perceber uma realidade do mundo que, na verdade, não existe. A própria guerra é uma ilusão, o inimigo não é real. Pensar o mundo a sua volta constitui crime, o que o sistema impõe é uma aparência de mundo sob absoluto controle, com as coisas funcionando perfeitamente. A indústria cultural desperta a mesma sensação de conforto. As indicações estatísticas da diminuição e controle das doenças indicam essa falsa realidade. As cenas em que o personagem central Winston (John Hurt), após ser persuadido a aceitar o regime, diz estar curado e revela seu amor ao Grande Irmão, prova esse caráter de dominação que qualquer regime ditador é capaz de estabelecer. Assim também é a indústria cultural, que reorienta as massas, definindo padrões de comportamento, mas que ainda permite a liberdade de dizer que dois mais dois são cinco.

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quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

O MAL-ESTAR NA CIVILIZAÇÃO - SIGMUND FREUD

Escrito na década de 1930, até hoje livro de Sigmund Freud mantém vivas as idéias e fundamentos do pai da psicanálise

José Donizetti Morbidelli

O Mal-Estar na Civilização, escrito por Sigmund Freud em 1929, apresenta como idéia principal a discussão da repressão que é imposta pela sociedade. Nesse meio social repressivo ao qual o autor se refere, cada indivíduo está exposto a uma espécie de policiamento, e essa alienação diante das regras inibe o desenvolvimento do ser humano. Como o instinto humano é, naturalmente, agressivo, ao se libertar desse sistema repressivo, a tendência é a destruição do meio em que vive. O desenvolvimento do indivíduo, bem como da civilização da qual faz parte, somente são possíveis a partir do controle das pressões impostas ao homem.
A vida de cada um é regida por dois princípios que se conflitam, o princípio do prazer e o princípio da realidade, que também podem ser chamados de instinto de vida e instinto de morte. Enquanto que o instinto de vida tem como fundamento interagir na civilização de forma a aproximar os indivíduos, trabalhando em favor da vida comunitária, o instinto de morte age de forma oposta, ou seja, contra a civilização. Por encontrar-se alienado ao meio em que pertence, diante das imposições de uma sociedade repressiva, e sem a possibilidade de um ambiente que permita a total liberdade, o ser humano não encontra possibilidades de concretização da felicidade, entendida como a liberação das energias instintivas. Nada supera a felicidade em seu âmago, contudo a plenitude não existe, somente alguns momentos de satisfação temporária, conseqüência dos impulsos, sobretudo sexuais. Embora seja um animal racional, essa característica instintiva aproxima o homem de qualquer outra espécie, independente da escala a que pertença.
Diante do conflito que se estabelece entre o princípio do prazer e o princípio da realidade, várias análises podem ser consideradas, e a principal é a relação existente entre o amor, cujo poder induz ao indivíduo a necessidade de não querer privar-se do objeto de desejo, e a dor, ou seja, sensação desagradável causada principalmente em virtude da não concretização de uma relação interpessoal. Enquanto que o amor é visto como instinto de vida e se manifesta, sobretudo pelo desejo e pela afloração da sexualidade, a dor enquadra-se no que Freud chama de princípio de morte, ou pelas manifestações da agressividade decorrentes da insatisfação e da incapacidade de concretização do amor.
O amor é uma das formas mais eficientes para a realização dos desejos, e a ausência de uma relação ou a insatisfação do desejo conduz à dor. Freud refere-se à dor basicamente como sentimento moral em vez de físico, a qual origina-se no próprio corpo e pode ser combatida pela química. Analisada como uma sensação ligada à moralidade e à busca da felicidade, Freud explica a proveniência da dor como reflexo das relações entre os indivíduos, sejam de caráter apenas afetivo ou tomadas por impulsos sexuais, e é justamente esse tipo de dor que tem a maior capacidade de ferir e atingir o ego do indivíduo. Como “remédio”, ou melhor, saída para a dor, aponta algumas alternativas: a desistência do desejo, a procura de algum prazer alternativo que possa saciar essa ausência, e ainda a fuga da realidade por meio da loucura, a criação de um universo íntimo, que pode também acarretar no uso de drogas como meio de evasão desse sofrimento.
Herbert Marcuse, um dos mais importantes estudiosos da obra de Freud, herdeiro das idéias marxistas e integrante da Escola de Frankfurt, escreveu trinta anos depois Eros e Civilização, no qual aprofunda os conceitos freudianos, principalmente em relação às repressões impostas pela sociedade e pelas diferenças entre princípio de prazer e princípio de realidade. Marcuse pensava na possibilidade de liberdade, contudo defendia um sistema com um mínimo de controle para manter uma harmonia social. O homem tende a se tornar mais agressivo à medida que seus impulsos são controlados. Para se chegar a essa conclusão, Freud e Marcuse utilizaram-se de caminhos diferenciados, porém ambos defendiam a idéia de contenção da agressividade por meio da diminuição da repressão e fortalecimento dos impulsos sexuais do ser humano.
Marcuse encontra ainda na obra de Freud uma hipótese de se criar por meio da psicanálise uma nova utopia, analisando conceitos históricos e sociais, e tentando aproximá-los às heranças marxistas, que embora colocadas em segundo plano em virtude da ascensão capitalista, ainda fazia parte de seus ideais.

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quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

UM SENTIMENTO CHAMADO CORINTHIANISMO

13 de outubro de 1977

José Donizetti Morbidelli

Internado num hospital por cair de uma árvore, naquela noite fui surpreendido por um foguetório ensurdecedor. Menino ainda, demorei para compreender o que estava acontecendo, até que um paciente me disse que era gol do Basilio. Mas quem é esse Basilio? – perguntei. Ele simplesmente me olhou, afirmou com toda a convicção que eu seria corinthiano e um dia iria compreender. Dito e feito! E o que se comentou ao final da partida é que o Corinthians finalmente havia sido campeão, depois de quase 23 anos sem títulos. Fiquei empolgado e, ao receber alta, ganhei uma camisa. Foi o início de uma paixão. Não, paixão é pouco para definir o sentimento que se apossou de mim. No meu universo colorido, parecia haver somente duas cores: o preto e o branco. Bendita mangueira que cruzou o meu caminho. Graças a uma árvore livrei-me de torcer por outro clube. Deus me livre! É diante dos perigos, das adversidades da vida que se aprende a ser corinthiano. Como é bom ser sofredor, o sabor da vitória é mais doce no final, infinitamente mais saboroso. Ser corinthiano não é simplesmente gostar de futebol, mas respirar, viver intensamente esse time, uma força motriz capaz de quebrar paradigmas e protocolos, lançar moda e criar cultura, unir povos inimigos. Também gera rivalidade, é claro, mas que graça teria se o futebol fosse unilateral? Corinthianismo é um sentimento que se adquire desde pequeno, tão marcante que deveria vir como marca de nascença, um órgão essencial para a sobrevivência e a continuidade da espécie. Talvez essa seja a melhor definição. O Corinthians é uma parte do próprio corpo humano, uma artéria do coração, a melhor metade da alma: o amor. Um amor que cresce a cada segundo e que até assusta. Enquanto existir o Corinthians, haverá o amor. E como o amor jamais acaba, o Corinthians também é infinito, e infinita é a sua grandeza. Geração após geração, vão se os ídolos, os torcedores, mas a história permanece. E a história do Sport Clube Corinthians Paulista é regada de conquistas. Mas qual é a mais importante? Impossível responder, a melhor ainda está por vir. Mas, para mim, a que está estampada em letra maiúscula na memória é aquela de 13 de outubro de 1977. Afinal, foi assim que eu me tornei filho dessa imensa nação alvinegra.

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TEMPOS MODERNOS - CHARLES CHAPLIN

Chaplin, um dos maiores mitos do cinema, critica a sociedade capitalista em Tempos Modernos

José Donizetti Morbidelli

O filme de Charles Chaplin é o retrato da sociedade capitalista que começava a se desenhar na Europa a partir do século XVIII, mais precisamente após a Revolução Industrial ocorrida na Inglaterra. A busca desenfreada pelo lucro é criticada de forma irônica por um dos maiores gênios que o cinema conheceu ao longo da história. Uma passagem significativa que aponta essa característica de produção é o momento em que o personagem trabalha de forma contínua e ininterrupta diante de uma esteira, tornando-se uma parte integrante da máquina, tanto que, ao encerrar o turno, continua com a mente voltada para os movimentos do trabalho. O cinema confirma-se então como uma nova manifestação artística, a “sétima arte”, e seu surgimento está estritamente ligado à evolução da fotografia. No princípio, o maior desafio do homem era transformar em imagens palpáveis aquilo que os olhos testemunhavam, e a partir daí “aprisionar o fantasma do movimento”, como fizeram os precursores irmãos Lumière. De volta a Chaplin, a história do cinema seria incompleta sem sua existência, sem a magia de fazer rir e chorar apenas com a expressão corporal e a fisionomia de um humilde cidadão.
A partir da intensificação da produção industrial a arte vai passar por uma mudança de conceito. As reproduções em série elevou o conceito artístico em relação à originalidade, e as artes passaram a ser cultuadas nos museus. Por outro lado, os objetos reproduzidos e que não eram tidos como obras de arte, permitiram que o povo estreitasse a relação com o artista. A reprodução industrial em série possibilidade que o cidadão comum decore a parede de sua sala com trabalhos de artistas de sua prefêrencia, mesmo porque a maioria dos originais pertence a acervos de museus e universidades, e têm uma valorização muito distante do poderio financeiro do grande público.
Ao traçar um paralelo entre o cinema e a reprodução da arte em série, compete apontar que o primeiro é a maior manifestação dessa nova característica industrial, que incorpora a tecnologia para atingir um grande público. A evolução tem que continuar sempre, mas os artistas que conquistaram esse espaço jamais deixarão de ser enaltecidos. Não somente os pintores e escultores renascentistas e outras tendências, mas também o ilustre Charles Chaplin com seu célebre personagem “Carlitos”, um dos maiores artistas que o mundo contemporâneo teve o privilégio de conhecer.

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TO VERDENER "MUNDOS SEPARADOS" - NIELS ARDEN OPLEV

O filme dinamarquês To Verdener mostra conflitos de comportamento de uma fiel da Sociedade Torre de Vigia

José Donizetti Morbidelli

O cinema dinamarquês não é lá dos mais conhecidos. Até hoje, o pequeno e próspero país do norte da Europa só legou à história da sétima arte filmes como A Festa de Babette e Pelle, o Conquistador (Oscar de melhor filme estrangeiro em 1988 e 1989, respectivamente, sendo que o último ainda levou a Palma de Ouro em Cannes), além de algumas fitas de caráter mais cult. Pois agora o país volta a ser manchete com o longa To Verdener (Worlds Apart em inglês, ou Mundos Separados em português), numa aposta um tanto inusitada. Baseado em fatos reais, o filme retrata os conflitos vividos pelos adeptos do movimento religioso Sociedade Torre de Vigia, mais conhecidos como Testemuhas de Jeová.
Considerado sectário pela maioria das igrejas evangélicas, o grupo vive em constante conflito com práticas que considera mundanas, sobretudo na questão dos usos e costumes. Pois é nesse meio que Sara – papel interpretado pela atriz Rosalinde Mynster – se vê dividida entre a fidelidade aos princípios estabelecidos pela doutrina e uma paixão arrebatadora. Acontece que o rapaz em questão, Pilou Asbaek, se não chega a ser um ateu, não deixa também de expor seus pensamentos acerca do que considera ser exagerado em relação a certas práticas religiosas da moça. Para piorar, os pais de Sara passam por uma séria crise conjugal, cabendo a ela – não bastasse os problemas pessoais que já enfrenta – tentar controlar a situação, com base nos princípios de fé ainda não transgredidos pelas descobertas amorosas. Um caldeirão e tanto, não é mesmo?
Quem dirige o filme é o dinamarquês Niels Arden Oplev, cujo nome é mais associado a produções infantis do que a histórias com temáticas religiosas ou dramas familiares como To Verdener – tanto, que ele foi um dos consultores estrangeiros convidados para o Laboratório SESC Rio de Roteiros para Cinema Infantil, evento realizado em São Paulo no mês de setembro. Adultério, preconceito e intolerância são alguns dos temas explorados pelo roteiro, ingredientes suficientes para render muitas discussões.

“Caminhos sem culpa” – A Sociedade Torre de Vigia é a instituição surgida nos Estados Unidos. Os testemunhas de Jeová praticam uma fé baseada em interpretações literais e fundamentalistas de trechos bíblicos. Ao contrário dos evangélicos, eles não consideram a divindade plena de Jesus e acreditam-se mais capacitados espiritualmente para enfrentar os episódios narrados no Apocalipse acerca do fim dos tempos. Um dos pontos mais polêmicos e conhecidos de sua doutrina é a proibição às transfusões de sangue, ainda que o procedimento seja considerado fundamental para salvar a vida do paciente – razão pela qual já moveram e sofreram inúmeros processos judiciais. Todas as decisões organizacionais e doutrinárias relativas ao movimento são tomadas pelo chamado Corpo Dirigente, órgão sediado em Nova Iorque, nos EUA, e considerado por seus adeptos como o único canal de comunicação entre Deus e a humanidade.
“A vida não é um filme, você não entendeu". É fazendo uso dos versos do cantor e compositor Herbert Viana que o professor de história e ex-testemunha de Jeová Jerry Santos Guimarães critica os que esperavam um desfecho mais hollywoodiano – ou o clássico final feliz – para o filme. “Muitos podem não gostar, mas eu acho que a história já vale a pena pelo fato de a personagem se libertar e, finalmente, poder escolher seus caminhos sem culpa”, diz. Atualmente, Jerry é candomblecista e um dos administradores do TJ´s Livres
(www.forum.clickgratis.com.br/tjlivres) – uma espécie de fórum de discussão que reúne relatos e troca de experiências entre ex-adeptos do movimento no Brasil e em Portugal. “Acho que a produção não deve ser analisada apenas como entretenimento, mas como ferramenta a ser utilizada pela dissidência para atingir membros da Torre de Vigia”, comenta.
To Verdener, que ainda não tem data para chegar ao Brasil; estreou no Festival de Berlim no início do ano e já abocanhou o Prêmio Signis no 24º Festival Internacional de Cinema de Tróia – o Festróia –, realizado na cidade de Setúbal, em Portugal. Na opinião do júri, Oplev explora com delicadeza e sensibilidade cinematográfica a escolha entre a fé, a entrega pessoal e o amor. Agora, a mira dos produtores está voltada para o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, já que o longa foi um dos escolhidos pela Dinamarca para concorrer a uma das vagas para a final. A cerimônia acontece em março, nos Estados Unidos. Será que a história de conflitos religiosos da jovem Sara terá a mesma consagração de A Festa de Babette e Pelle, o Conquistador, vinte anos depois?

Fonte: Revista Eclésia - Edição 128
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NATAL - ENFEITES, PRESENTES E POLÊMICAS

O Natal, principal celebração dos cristãos, não é unanimidade entre os evangélicos


José Donizetti Morbidelli

Árvore de Natal, presépio, guirlanda, luzes piscantes... Você já imaginou como seria o Natal sem eles? Fim de ano é época de enfeitar casas e lojas e entrar no tal espírito natalino, que enche corações e mentes nessa época. Principal festa da cristandade, o nascimento de Cristo tem muitas formas, e foi adquirindo características diferentes em cada sociedade onde é celebrado. Mas o que é unanimidade entre as pessoas em geral gera algumas controvérsias no segmento evangélico. Não são todos os crentes que festejam o Natal – e muitos dos reticentes argumentam que todos esses adereços têm origem pagã, sendo impróprias, contudo, para uso em igrejas e lares cristãos. Por outro lado, muita gente argumenta que o Natal não é mencionado nas Escrituras, restando controvérsias até mesmo acerca da data do nascimento do Filho de Deus na terra. Consumismo, bebedeiras e outros exageros nos festejos são motivos mais do que suficientes para que muitos evangélicos prefiram manter-se à parte do clima natalino.
A bem da verdade, é preciso lembrar que o Natal que hoje conhecemos teve origem num festejo pagão, o do nascimento do Sol. Veio daí o mitraismo, espécie de culto instituído a partir do ano 274 pelo imperador romano Aureliano para fazer frente a uma festividade que já fazia parte do calendário cristão. A basear-se por teorias históricas, o argumento de determinados grupos de evangélicos em relação à “descristianização” do Natal é completamente desprovido. Contudo, há outros argumentos usados para tirar da data a importância que lhe é atribuída. Com o rigoroso inverno da Judéia, no mês de dezembro, os pastores costumavam, principalmente à noite, recolher seus rebanhos para as estribarias, a fim de protegê-los do frio. Logo, não poderiam estar em vigília nos campos, ao ar livre, conforme descreve o evangelho de Lucas 2.8-13.
De acordo com Joaquim de Andrade, professor de teologia e pastor da Igreja Missionária Evangélica Maranata na Tijuca, Rio de Janeiro, controvérsias em relação à data exata em que Jesus nasceu não invalidam o propósito do Natal. “O que importa é o propósito, não a data”, acredita o religioso, que também é apologista e presidente do Centro Religioso de Estudos e Informações Apologéticas (Creia). Para Andrade, são vários os motivos que, na opinião de alguns crentes, contribuem para a rejeição aos festejos natalinos, principalmente em relação à figura do chamado Bom Velhinho. “Papai Noel é um personagem místico com atributos divinos, incluindo onisciência e onipotência”, descreve. “Ele distrai a atenção de Cristo no Natal. As crianças perdem a fé nos pais quando descobrem que ele não é real, e sua presença ainda as ensina a serem materialistas”, enumera.
Contudo, o pesquisador defende que, independente das objeções impostas ao gorducho de roupa vermelha, é perfeitamente possível a celebração da data sem sua simbólica presença. “Retire Papai Noel e o Natal permanece intacto. No entanto, retire Cristo – e tudo que sobra é uma festa pagã”.

“Jesus não nasceu” – Se o tradicional pinheirinho é um adereço quase obrigatório nos ambientes familiares no mês de dezembro, crentes de diversos segmentos denominacionais o rejeitam, associando-o ao objeto descrito no livro do profeta Jeremias, cujos versículos 10.3-4 dizem o seguinte: “Pois os costumes dos povos são vaidades; corta-se do bosque um madeiro e se lavra com machado pelas mãos do artífice. Com prata e com ouro o enfeitam; com pregos e com martelos o firmam, para que não se movam”. “Certamente há uma semelhança entre a coisa descrita e a árvore de Natal; no entanto, semelhança não é igual a identidade”, pondera o pastor Joaquim de Andrade, defendendo a tese de que profeta se referia a um ídolo – a representação de um falso deus.
“Jesus não nasceu, ele é eterno, tomou carne sobre si e veio ao mundo para cumprir seu propósito de salvar o homem e levá-lo consigo para a eternidade. Por isso, respeito mas não comemoro o Natal”, comenta Ana Lúcia Barone de Santana, que é membro da Comunidade Evangélica em Vila Nova Cachoeirinha, bairro da zona norte de São Paulo. Embora concorde com o teólogo acerca do risco das interpretações literais das Escrituras – “Não podemos isolar um versículo do contexto bíblico” –, ela prefere passar o Natal longe de tudo aquilo que, para a maioria das pessoas, é a própria essência da festa: os enfeites, festas e presentes. De qualquer forma... feliz Natal a todos!

A trajetória de um mito

Conta-se que Nicolau foi um religioso muito querido pelos cristãos de seu tempo, por volta do século 4 da Era Cristã. Diz a tradição que ele era muito generoso, e tinha o costume de dar pequenos presentes às crianças carentes. Sua fama correu e, pelos milagres que lhe foram atribuídos, foi nomeado bispo da cidade de Mira, na Ásia Menor (hoje, a região compreendida pela Turquia). Após sua morte, a figura de Nicolau conquistou devotos. Além de artistas medievais que o reproduziam em suas artes, até o imperador romano Justianiano I rendeu-lhe homenagens, construindo uma igreja no século 6 em Constantinopla – atual Istambul, capital da Turquia. Com a Reforma Protestante, o culto a São Nicolau praticamente minguou na Europa, restringindo-se somente à Holanda, tradição essa que os colonizadores levaram para a América no século 17. Em pouco tempo, o mito do Sinterklaas holandês conquistou os americanos, que começaram a chamá-lo de Santa Claus. Numa estratégia de marketing para conquistar o público infantil, a gigante dos refrigerantes Coca-Cola contratou cartunistas para dar novas feições ao personagem por volta dos anos 1930. O Papai Noel, como é conhecido hoje, com sua roupa vermelha e branca – alusiva às cores da empresa –, bochechas rosadas e pinta de vovô gentil, surgiu a partir dos esboços de um artista sueco chamado Haddon Sundblon. Detalhe – conta-se que o desenhista era um beberrão inveterado.

Fonte: Revista Eclésia - Edição 129
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